Lembra daqueles anos dourados, quando o autor só escrevia, o editor só publicava e a livraria só vendia... livros? Quando os livros eram todos feitos só de papel? Se seus belos cabelos são agora brancos ou grisalhos sob a tintura, ou se abandonaram covardemente o pobre couro cabeludo há muito tempo, pode ser que tenha conhecido esses anos, sim.
Mas, se você for ainda um tanto jovem, é bem provável que não tenha conhecido esse mundo encantado, que os saudosistas costumam chamar de os bons tempos.
Pois é, hoje, quando os anos não têm mais o prosaico brilho do ouro, as livrarias vendem de tudo um pouco para sobreviver: caneta hidrográfica, pen drive, café expresso, pão de queijo e até – teimosamente – livros. Que não são mais só de papel, podem ser arquivos de áudio ou de texto/vídeo, que pairam em nuvens invisíveis que nunca chovem.
Os editores seguem em seu metiê, mas tiveram que aprender a mercadejar usando amplas equipes especializadas em marketing e vendas, perderam a aura romântica de um José Olympio, de um Ênio Silveira, de um Diaulas Riedel.
Já os escritores passaram pela maior metamorfose de todas. Forçados a abandonar a pena pela máquina de escrever e esta pelo Word e o teclado, entraram a multiplicar-se geometricamente, num prodigioso número muito superior ao que poderia ser absorvido pelos editores, que andaram se multiplicando em progressão um tanto aritmética, já que, entre os grandes, evidenciou-se um processo concentrador autofágico, em que o maior come o menor.
Contudo, para acomodar o astronômico enxame esvoaçante de novos autores, verdadeiros sem-teto editoriais, surgiram as pequenas editoras, a impressão sob demanda e a autopublicação. Aos milhares em terras tupiniquins, aos milhões em todo o mundo, surgiram os indies, os autores independentes. Independentes do quê? Ora, de editoras que lhes permitam a doce vida tranquila dos bons tempos, em que eles só tinham que se preocupar em escrever e negociar o seu manuscrito com um editor, que, a partir daí, se encarregava de tudo o mais na longa cadeia do livro.
Hoje os autores, sejam eles autopublicados ou vinculados com editoras de maior porte – tanto faz – tiveram que abraçar uma segunda carreira, a de vendedor, modalidade caixeiro viajante dos bons tempos. O atenuante é que agora eles viajam tanto por vias terrestres ou aéreas, quanto pelas infovias congestionadas da sacrossanta Internet. E esta, quando eles aprendem os segredos do seu uso, lhes faculta mostrar nacional e até internacionalmente quem eles são e qual sua obra, o equivalente digital do camelô dos bons tempos, que, para se apresentar e vender seus produtos na nova cidade, reunia o povo liberando sobre a calçada a proverbial dupla da cobra Catarina com o lagarto Pascoal. Ainda vou lhe mostrar que hoje a gente pode vender muito livro usando o mesmo e velho recurso da Catarina com o Pascoal. Me aguarde.
Sinal dos tempos, sobra para uns 95% de todos os autores essa dupla carreira, de escritor e vendedor. As editoras de porte têm prodigiosos departamentos de marketing, vendas e pós vendas. As editoras pequenas e os autores independentes, não. Então torna-se inevitável que o autor independente (ou o vinculado à pequena editora) tenha que metamorfosear-se em seu próprio e prodigioso departamento de marketing, vendas e pós vendas.
A editora de porte investe pesado na promoção do autor e do seu livro, dá-lhe cobertura de mídia inicial, trabalho de pré-venda, assessoria de imprensa. E então despacha-o como caixeiro-viajante, para se apresentar em cada cidade grande, como o melhor vendedor do seu livro. Agora imagine só a situação do autor que não recebe essa impulsão, não é arremessado por essa catapulta especializada! É, ou ele aprende a reunir em si mesmo forças suficientes para alçar voo solo ou a alternativa é o... fracasso! Que se substancia assim: em média, os autores independentes conseguem vender só 100 exemplares de um livro. O resto encalha ou eles doam. Esta é uma média mundial, vale tanto aqui, como nos EUA ou na Europa. Isso ocorre tanto por razões quantitativas como qualitativas, mas este é um tema que não pode ser tratado neste artigo, que tem outra finalidade específica.
É fato que existem autores independentes que conseguem vender centenas de milhares de exemplares de um mesmo livro. Sem nenhuma editora de porte catapultando suas vendas. Em um próximo artigo desta série vou mostrar exemplos desses indies bem sucedidos, tão bem sucedidos que recusam contratos de publicação com as maiores editoras. E vou mostrar por que razões eles são tão bem sucedidos assim, uma receita que pode ser usada por qualquer um.
Também é fato que, para cada um deles, existem milhares de outros que não conseguem vender nem dez livros, de forma que a média mundial de cem exemplares se estabelece com facilidade.
Certamente, caro leitor, esses números anêmicos de vendas, como 10 ou 100, não são do seu interesse, não é mesmo? Então vamos ver algumas das táticas usadas pelos indies de sucesso, para que você aprenda a replicá-las em suas próprias promoções e vendas. As que vamos mostrar aqui neste artigo são:
1 – O livro, tanto faz se de não ficção ou de ficção, é escrito sempre para um público-alvo extremamente específico, que o autor estudou a fundo, conhecendo-lhe as características de faixa etária, gênero, geografia, poder aquisitivo, nível cultural, gostos, tribos, etc. Essas estatísticas estão disponíveis na Web, basta que a pessoa se decida a investir tempo e esforço no aprendizado.
2 – O autor, muito antes de lançar o livro, começa o trabalho de construção de uma sólida plataforma de escritor, direcionada desde o começo ao seu nicho, ou seja, àquele particular público-alvo que ele sabe que é o que vai comprar o seu livro, público para o qual ele escreveu e revisou cada frase do seu manuscrito, nos momentos solitários em que ele exerceu uma de suas duas profissões – a de escritor. Em todos os demais momentos, ele exerce a outra: ele é vendedor!
3 – Como estamos falando de um indie de sucesso, estamos tratando de um escritor profissional, aquele que não escreve e publica um único livro, mas que vai estabelecer sua carreira muito bem remunerada em cima de uma quantidade muito maior de obras, nas quais cada livro funciona como um eficiente promotor de vendas do livro seguinte para seus leitores fidelizados. Estes são seguidores fiéis, inscrevem-se nos canais do autor, a Amazon avisa quando ele vai lançar o próximo livro e já o coloca em pré-venda. O leitor compra no ato, mas só é debitado na data exata do lançamento pela Amazon.
O que aconteceu para esse resultado tão extraordinário? Simples, o leitor está comprando o autor, não o livro x ou y desse autor. Imagine só se, por um milagre inexplicável, dia 12 de dezembro está marcado para o lançamento do próximo romance de... Machado de Assis! Vamos lá, não custa imaginar, homem de pouca fé. Confie no meu milagre. Imaginou? Milhões de pessoas, certamente não adolescentes, correriam para comprar a sequência da série, onde finalmente o autor revela se Capitu sim... ou não.
Bem, esse é o segredo do sucesso: torne-se você mesmo, autor, o produto mais importante. Ou seja, é VOCÊ é o produto que você tem você que vender quando monta e põe em andamento a sua plataforma. Você! Isso se você quiser dar continuidade a sua carreira de escritor e vender mais e mais livros pelos anos a seguir. E viver disso.
Observe que em todo e qualquer livro você costuma ver uma fotografia e uma mini bio do autor, mostrando suas credenciais. Normalmente isso está na última capa ou nas orelhas da capa. Por quê? Porque o leitor exige. Isso é humano: Quem é esse sujeito? Como é a cara dele? Que idade tem? Que mais dizem sobre ele? Quem o endossa ou referenda?
Depois que você comprova, com seu primeiro livro, que você tem competência, o leitor (que é parte daquele público-alvo que você escolheu antes de escrever) que chegou ao fim dele e o fechou com gosto de quero mais, está pronto para comprar qualquer outro livro seu. Você acabou de ganhar um adepto. Você começou a montar a sua tribo. A partir daí você tem que manter contato constante com esse leitor, através do seu site ou blog de escritor, através de seus e-mails regulares da sua mailing list, através de sua News Letter, através de seus eventos públicos e/ou de Internet.
Começando sua autopromoção
Vamos agora partir para o estabelecimento prático desse processo, supondo que você é marinheiro de primeira viagem, que está escrevendo o seu primeiro livro. Eu disse... escrevendo. É o ideal. Mas, se você já escreveu... bem, vamos em frente, adapta-se a coisa. Não, pior: Você não só já escreveu como já publicou o livro. E ele, digamos delicadamente, tocou com o casco no fundo de areia e parou. Bom, vamos ver o que dá para fazer.
Partimos da condição mais desfavorável: este é seu primeiro livro e você é um completo desconhecido. Sua plataforma é zero.
Muito bem, comecemos pelo livro.
1) Por escrever;
2) Sendo escrito.
3) Já escrito e inédito
4) Já publicado.
Então vem a primeira pergunta:
– Qual é o seu público-alvo? Você sabe? Sabe mesmo? Pesquisou bastante sobre ele, conhece-lhe todas as dimensões críticas, todas as estatísticas, sabe quantos eles/elas são em cada região e tudo o mais? Sabe quais são os outros autores que eles consomem de preferência?
Veja que não é você que tem que se conformar rigidamente a esse público-alvo, em sacrifício de sua criatividade, arte ou ética. Estabeleça claramente estes valores para você primeiro. E aí veja, no universo dos gêneros, subgêneros e tribos leitoras, qual o nicho que lhe é mais conveniente, antes de começar a escrever.
E aí é que se tem que ter um certo jogo de cintura, para estabelecer um compromisso entre o que se quer e o que se pode fazer. Normalmente vale a pena fazer algumas concessões, ainda dentro dos limites éticos, artísticos ou técnicos do autor, para atingir um universo um pouco maior de leitores, alargando o tamanho do nicho escolhido. Afinal disso depende o sucesso futuro das vendas, quer o autor seja independente, quer seja aceito por uma editora de porte.
Perceba que ninguém, ninguém mesmo de fora desse nicho vai comprar seu livro. É simples, só esses gostam disso, os outros todos vão gastar seu tempo e seu dinheiro com outros temas e outros autores. Vive la diference!
Em resumo: Pare tudo o que está fazendo e vá estudar seu melhor nicho potencial. Parta de quem e do que você é, colocando os primeiros limites. A seguir coloque a IDEIA do seu livro: tema, forma, estilo, mensagem, finalidade, a quem serve, o que acrescenta. Coteje agora essas duas condições limites – você e o seu livro – com os diferentes públicos que existem. Estude-os até encontrar o seu. E aí sim, a partir disso, adapte-se a escrever em função de atingir o maior número possível de leitores dentro desse nicho. Faça as concessões que você aceitar, que seu consultor editorial ou seu editor, que seus leitores beta indicarem.
(CONTINUA)